A luta pela afirmação do Piso Nacional do Magistério teve o fôlego renovado em Alvorada, município da região metropolitana de Porto Alegre, com população estimada em 212,3 mil habitantes (IBGE/2021), dos quais 1,6 mil são professores. Após decisão em assembleia, os educadores paralisaram as atividades por um dia, propositalmente no primeiro dia de abril, data consagrada como o “Dia da Mentira”. Em assembleia realizada no local da manifestação os educadores aprovaram novos passos da jornada.
A partir das 8 horas da manhã, os professores iniciaram a concentração que mais tarde ocuparia a Praça Leonel Brizola, logradouro em que está localizado o prédio da prefeitura municipal. Cadeiras de praia, apitos e o tradicional chimarrão deram o colorido à manifestação ordeira da categoria, que reivindica o cumprimento de uma lei federal, descumprida pelos prefeitos, que preferem seguir uma orientação da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), que incentiva a desobediência à legislação e a aplicação do INPC de 2021, medido pelo IBGE em 10,16%.
Dois momentos marcaram o ato nos turnos da manhã e da tarde, quando os manifestantes reuniram-se diante do prédio da prefeitura empunhando o cartaz do sindicato que cobra o cumprimento do direito constitucional. O Sindicato dos Municipários de Alvorada (SIMA) fez a convocação por meio de carro de som, colou cartazes e mobilizou aliados do movimento social em defesa do pagamento do Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN) para os profissionais do magistério público da educação básica, legitimado pela Lei n° 11.738, de 2008.
“DIA DA MENTIRA”
A data da paralisação define o que os professores pensam da administração municipal: o 1º de abril é popularmente conhecido como o “Dia da Mentira” e denuncia a falta de palavra dos gestores da administração José Arno Appolo do Amaral.
Logo após o término da campanha salarial, em 17/12/2021, os dirigentes do SIMA estiveram com os secretários Luiz Carlos Telles, da Administração, e Paulo Ramos, do Planejamento e Orçamento, quando ouviram a declaração de que a prefeitura cumpriria a lei do Piso e complementaria os valores nos vencimentos dos educadores. Além de um áudio, de posse dos sindicalistas, o compromisso está registrado em ata.
Somente R$ 304,03 separam o salário pago aos professores dos valores preconizados pelo Piso Nacional, que foi validado pelo presidente da República, em portaria editada em 04/02/2022. Os sindicalistas protestam que, em vez de cumprir o que determina a lei, a prefeitura oferece gratificações que não aumentam os salários e não são repercutem nos direitos sociais.
O DINHEIRO QUE NÃO CHEGA NA EDUCAÇÃO
Em busca dos meios legais que obriguem o governo municipal a cumprir a lei, Rodinei Rosseto, presidente do SIMA, foi até foi até Geraldo Costa da Camino, Procurador-Geral do Ministério Público de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (MPC-RS), para encaminhar denúncias de irregularidades no desempenho da administração, como o gasto exorbitante de combustível em transporte escolar no auge da pandemia, quando não havia aulas em Alvorada.
A aplicação inferior aos 25% que os municípios são obrigados a investir na Educação também consta do relatório apresentado pelo SIMA ao MPC-RS. Em pronunciamento no ato, Rafael Lemes, Advogado do SIMA, denunciou que faz pelo menos cinco anos que a prefeitura de Alvorada não cumpre o mínimo constitucional de 25% do orçamento determinados por lei para a Educação.
A constatação foi feita pelo Ministério Público de Contas (MPC-RS), instituição permanente que atua no Tribunal de Contas do Estado (MPC-RS), com a função de exercer a fiscalização e o controle externo dos bens e gastos públicos, assim como do orçamento e das finanças das administrações públicas. No Brasil, em 2020, conforme dados do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope), dos 5,2 mil municípios brasileiros que fizeram as declarações, 316 não aplicaram os 25%.
APOIO DE ALIADOS E DO MOVIMENTO SOCIAL
Personagens da luta social e políticos progressistas também compareceram na manifestação em solidariedade aos educadores alvoradenses. O deputado federal Dionilso Marcon, as deputadas estaduais Luciana Genro, do PSOL, e Stella Farias, do PT, reforçaram o que as lideranças do magistério vêm pregando.
Luciana Genro, fundadora do PSOL, disse ser “incrível que a gente precise lutar para que uma lei seja cumprida, pois seria obrigação dos governantes cumprir a lei“. Para ela, o descumprimento deveria motivar o impeachment, o afastamento do poder. “Um prefeito que se recusa a pagar o piso do magistério, não tem autoridade política para seguir à frente da prefeitura“, afirmou a deputada.
“FILHOS DA ESCOLA PÚBLICA” – Em depoimento contundente, a professora Taiamanda Santana denunciou o quadro de precarização da escola pública, a partir do projeto de destruição do serviço público. Além de ser professora do município e do Estado, ela foi aluna da escola pública e hoje o filho que também estuda em uma instituição pública de ensino .
“Compramos essa briga, porque não temos escolha: nós somos filhos da escola pública e lutamos por ela“, afirmou a educadora, para quem não há outro caminho, senão ocupar a praça e reivindicar nossos direitos. “Estaremos nós aqui, sempre, quantas vezes for necessário“, reafirmou.
Renato Ilha, jornalista (Fenaj 10.300)